Conhecida pelo seu cedro majestoso e uma vinha única no país, a Quinta do Noval conta uma história muito especial no Douro
Sentada no pátio frente à casa principal, debaixo da sombra do maior cedro que já vi, aprecio a vista para os socalcos, com uma curva do rio Douro a espreitar lá ao fundo.
À minha frente tenho tintos, brancos, Vintage e Portos Colheitas servidos com boa comida caseira e entre boas conversas.
É assim que vou lembrar o dia em que visitei a Quinta do Noval.
O nome Quinta do Noval apareceu pela primeira vez em registos em 1715, ou seja, bem antes da demarcação do Douro como região vitivinícola. E, na verdade, Noval é o nome daquele lugar e o nome da quinta desde a sua fundação.
Sabe-se que a história do Noval, tal como a conhecemos hoje, começou pela mão de
António José da Silva, comerciante de Vila Nova de Gaia que comprou a quinta em 1894, pouco depois de esta ter sido devastada pela praga da filoxera. Ele reestruturou a propriedade, replantando as suas vinhas.
Mas foi preciso esperar até 1931 para esta casa ganhar nome, com a declaração do Quinta do Noval Porto Vintage e o Quinta do Noval Nacional Porto Vintage, ambos do mesmo ano.
Os dados estavam lançados e desde esse momento a Quinta do Noval colocou-se entre os grandes nomes do vinho do Porto Vintage no mercado Inglês e norte-americano, uma posição de liderança em termos de reputação, que ainda hoje mantém.
Desde 1993 que a Quinta do Noval faz parte do grupo vinícola internacional AXA Millésimes que é proprietária de muitas outras adegas pelo mundo nomeadamente em França, Tokaj e Napa Valley.
A VINHA NACIONAL
Caminhando pela quinta, na companhia de Carlos Agrellos – Director técnico e Enólogo – cheguei até à icónica vinha ‘Nacional’. Trata-se de uma vinha de 2 hectares apenas, plantada em 1924. Mas mais do que uma vinha velha, esta é uma vinha plantada em pé-franco a partir de uma vinha sobrevivente à filoxera.
Esta foi uma terrível praga que invadiu a Europa em meados do sec. XIX que dizimou grande parte das vinhas em França, Espanha, Portugal e que acabou por se espalhar por muitos outros países no mundo.
A forma de salvar as vinhas, ou de se evitar a repetição desta catástrofe no futuro, foi plantar vinhas enxertadas em que metade da planta – a parte da raiz em contacto com o solo – era de espécie Americana e a outra metade – a parte acima do solo – era de Vitis Vinifera, a espécie europeia da vinha.
Acontece que a vinha Nacional é ainda hoje, toda ela, europeia e isso é algo raro na Europa, o que torna estes 2 hectares muito especiais e únicos no Douro.
A palavra “Nacional” reflecte exatamente o facto de serem videiras portuguesas, que crescem em solo português, sem porta-enxerto Americano, e por isso directamente “enraizadas no solo da nação”.
As uvas destas videiras, originam um vinho também ele único no país, o Vintage Nacional.
Provar este vinho é um por si só, um acontecimento. Prová-lo naquele cenário, junto do enólogo a poucos metros da própria vinha, é um privilégio que eu tive a sorte de experienciar.
Tem maioritariamente Touriga Francesa mas também Tinto Cão, Touriga Nacional, Sousão e Tinta Roriz. A pisa é feita a pé durante 3 horas e estagia 18 meses em velhos tonéis até ao seu engarrafamento.
Assim à primeira vista, assemelha-se a muitos outros vinhos do Porto mas, segundo Christian Seely – Diretor-Geral da AXA Millésimes: “O Nacional Vintage é o que é por causa das uvas e da sua parcela de origem, não por causa de um processo especial de vinificação”.
Aqui está a prova de que a matéria-prima é o segredo para um vinho de excelência!
E é de facto sublime este Porto! É como beber compota de amora e cereja e cassis com notas de eucalipto. Mas surpreendentemente, é seco e com alguns aromas de terra a lembrar o solo pobre de xisto de onde nascem estas uvas. No nariz é intenso, mas na boca é elegante e fresco. O final esse, é longo e inesquecível!
É com orgulho que este produtor afirma ser o vinho do Porto mais apreciado do mundo!
Dada a sua produção extremamente reduzida, a quantidade vendida de Vintage Nacional é muito pequena e por isso chega ao mercado a um preço muito elevado (a garrafa Vintage Nacional 2019 custa 820€)
Em Portugal, além da Quinta do Noval, a AXA Millésimes é também recente proprietária da Quinta do Passadouro – comprada em desde 2019 – igualmente conhecida e reconhecida pela qualidade dos seus vinhos.
Trabalhar as vinhas da Quinta do Passadouro foi um prazer extra para a equipa de Agrellos, não só pela sua qualidade, mas porque – dada a proximidade – têm características muito semelhantes às vinhas do Noval.
Os 36 hectares da Quinta do Passadouro juntam-se aos 145 da Noval, uma área de vinha total de 181 hectares de excelentes uvas.
De brancas tem Códega do Larinho, Rabigato, Viosinho e de tintas de Touriga Franca, Tinta Roriz, Touriga Nacional, Tinto Cão e Sousão, usadas em todas as gamas Quinta do Noval.
À beira da piscina infinita, por entre socalcos, provei também o Cedro do Noval branco. Este é da gama de entrada da Quinta do Noval mas que já eleva bastante a fasquia para as gamas seguintes!
Este branco é feito maioritariamente de Gouveio, mas também Viosinho que fermentou e estagiou em madeira, e ainda foi usada a técnica de batonnage. Estas características podiam indicar um vinho encorpado e com os sabores da madeira – manteiga, baunilha, tosta, etc – muito presentes, mas na verdade o resultado é muito elegante, fresco e guloso!
Nesse mesmo dia provei cerca de 15 vinhos, mas além do Vintage Nacional 2019 e do Cedro do Noval branco 2020 também o Quinta do Noval Reserva tinto 2017 e o Noval Colheita 2016 ganharam um lugar especial no meu coração!
ENOTURISMO NA QUINTA DO NOVAL
A visita que eu fiz naquele dia, qualquer pessoa pode fazer, desde que marque com antecedência.
A recepção é sempre debaixo do cedro centenário da Quinta, em Vale de Mendiz. Depois segue-se para conhecer a vinha e a icónica parcela Nacional. A visita continua pela adega antiga com lagares de granito e pelo armazém de tonéis de madeira.
A descoberta do Noval fica completa com uma prova de vinhos na tradicional casa da Quinta.
Pode também optar por conhecer umas das duas lojas do produtor: em Vila Nova de Gaia ou no Pinhão.
Em ambas as lojas se organizam 4 tipos de provas diferentes (lamento, nenhuma delas inclui o Nacional!) e se quiser pode ainda juntar às provas um “Chocolate Pairing” com bombons artesanais portugueses.
Não esquecer também o azeite virgem extra – 0,2% acidez – da Quinta do Noval, feito com a azeitona galega, cordovil, verdeal e madural.
A Quinta do Noval não só faz parte da história do vinho em Portugal mas também da Europa! Foi uma emoção grande para mim conhecer esta vinha, o seu vinho e aprender mais sobre o meu querido Douro